INTERNACIONAL
Turco ligado a opositor de Erdogan nega acusação de terrorismo em SP
O empresário turco naturalizado brasileiro Ali Sipahi contestou em depoimento na Justiça Federal em São Paulo a acusação de terrorismo do governo da Turquia, que pediu ao Brasil sua extradição, e afirmou que sua prisão é arbitrária, segundo seus advogados. Ele é acusado pelo presidente da Turquia, Recep Erdogan de fazer transações financeiras em um banco do grupo Hizmet, de oposição ao líder turco, ligado ao clérigo Fethullah Gülen.
A linha apresentada pela defesa, segundo o porta-voz do Hizmet Kamil Ergin, teve como base contestar a versão do governo turco de que o Hizmet é um grupo terrorista. Segundo ele, apenas países de maioria muçulmana com relações comerciais próximas com a Turquia, como a Somália e o Marrocos, aceitaram extraditar militantes do grupo. "É a primeira vez que um pedido desse chega ao Brasil, mas quando pedidos similares foram feitos em países democráticos como os Estados Unidos, o Canadá, a Austrália e Reino Unido, a Justiça desses países negou todos eles."
Ainda de acordo com o porta-voz do Hizmet, o movimento está otimista que conseguirá demonstrar ao ministro Edson Fachin, relator do pedido de extradição no STF, que o grupo não tem relação com atividades terroristas. "É um caso de perseguição política. Centenas de juízes, jornalistas e funcionários públicos ligados ao Hizmet foram presos por Erdogan na Turquia", acrescentou.
Segundo o advogado de Sipahi, Theo Dias, pela primeira vez o empresário pode se explicar sobre a vida dele no Brasil e alegar que prisão é arbitrária. "O Brasil entrou na geopolítica da estratégia internacional de perseguição e retaliação do governo turco contra aqueles que se opõe ao regime", disse. "Cerca de 250 cidadãos turcos residentes no Brasil e ligados ao Hizmet serão alvos de Erdogan (se o País abrir o precedente e extraditar Sipahi)."
A Procuradoria-Geral da República enviou um representante para a audiência para acompanhá-la. O procurador, segundo a assessoria do MPF, não se manifestou e deve enviar um relatório para a PGR sobre o depoimento. Com base nisso, a PGR deve decidir se manifesta-se ou não novamente nos autos. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu a prisão preventiva de Sepahi no início do trâmite do processo, referendada por Fachin. No dia 10, o ministro do Supremo deve se pronunciar novamente sobre o caso.
A mulher de Sipahi, Merve, esteve na audiência e conseguiu falar por 10 minutos com o marido pela primeira vez desde sua prisão, em abril. Segundo ela, Ali está otimista que conseguirá escapar da extradição e mostrou preocupação com o filho do casal, de apenas 3 anos.
"Ele me pediu para ser forte e fazer orações pela sua libertação", disse Merve, num português carregado que precisou de ajuda de amigos para a tradução. "Ele quer que nosso filho não sofra com todo esse processo."
"O Ali é uma pessoa muito forte psicologicamente, mas ele está consciente do risco que corre", acrescentou o advogado. "Se ele voltar para Turquia será alvo de evidente retaliação."
Parentes do empresário, membros da Centro Cultural Brasil-Turquia (CCBT) e da Câmara de Comércio e Indústria Turco-Brasileira (CCITB) estiveram na audiência. Sócio de Ali num restaurante turco na rua Augusta, o também empresário Elias Kar, diz que depois da prisão de Ali funcionários da casa relataram episódios esporádicos de xenofobia na porta do local. "Já teve gente passando aqui nos chamando de terrorista", disse.
A Turquia alega que a movimentação de 1,1 mil liras turcas em 2015 - o equivalente a cerca de R$ 1 mil, serviu para "financiar atividades terroristas. A transação foi feita antes de Sepahi se naturalizar brasileiro, o que, pela lei, em tese, permitiria a extradição. A família de Sepahi, no entanto, diz que o dinheiro provém de presentes de casamento.
Erdogan atribui a Gülen o golpe de Estado frustrado contra ele em 2016. O clérigo mora nos Estados Unidos e nega as acusações. Segundo o Hizmet, Erdogan forjou o golpe para ampliar seus poderes e perseguir críticos no país.
Em nota, a embaixada turca afirma que não se pronunciará sobre o caso de Sepahi individualmente e que o Hizmet é uma fachada para as "atividades da organização criminosa e terrorista FETÖ".