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Catador correu para salvar criança de carro fuzilado, diz viúva

18 Abr 2019 - 19h07Por Roberta Jansen e Renata Okumura

O catador de papel Luciano Macedo, de 27 anos, morreu no início da manhã desta quinta-feira, 18, no Hospital Carlos Chagas, na zona norte, onde estava internado desde o último dia 7. Macedo foi atingido por três tiros nas costas por militares do Exército que mataram também, na mesma ação, o músico Evaldo Rosa, de 46 anos.

O carro de Evaldo, que levava o sogro, a mulher, o filho e uma amiga da família para um chá de bebê, foi atingido pelo Exército com 80 tiros. Supostamente, os militares confundiram o carro com o de um bandido. Ao tentar socorrer a família, Macedo acabou também sendo ferido. Nove militares estão presos.

A viúva de Macedo, Daiane Horrara, de 27 anos, que está grávida de cinco meses e estava no local no dia do crime, contou que, quando o marido viu que havia uma criança no banco de trás do carro, correu para salvá-la e conseguiu tirá-la de dentro do veículo.

Na tarde do domingo, dia 7, a família seguia para um chá de bebê. Ao passar por uma patrulha de militares do Exército, em Guadalupe, na zona norte, o carro - supostamente confundido com o de bandidos - foi alvejado por mais de 80 tiros sem qualquer tentativa prévia de identificação dos passageiros.

Atingido, Evaldo caiu sobre o volante. Seu sogro, que estava no banco do carona e também foi ferido, conseguiu parar o carro. Foi então que a mulher de Evaldo, Luciana, que viajava no banco de trás com a amiga e a criança, saiu do carro correndo e gritando por socorro. Luciano e a mulher Daiana estavam na beira da via recolhendo pedaços de madeira para construir uma casa na comunidade vizinha.

"Quando ele viu a mulher correndo e a criança no banco de trás do carro, ele saiu correndo e tirou a criança lá de dentro", contou Antonio Carlos Costa, da ONG Rio da Paz, que está dando apoio à família do catador e conversou com Daiana. "Ela (Daiana) me contou que ele era muito ligado em criança, por isso correu para salvá-la."

Ainda segundo o relato de Daiana, depois de deixar a criança a salvo, Luciano voltou ao carro para tentar socorrer Evaldo. Foi então atingido pelas costas com três tiros. Ele caiu no chão, agonizando, e chamou pela mulher. Daiana conta que o tirou do sol, arrastando-o para uma área de sombra. Um soldado do Exército se aproximou, fuzil em punho, e, em vez de socorrê-lo, ordenou a Daina que se afastasse do marido.

"Foi como se tivessem me quebrado os dois braços e as duas pernas", comparou Daiane em seu depoimento a Antônio. "Ele era meu companheiro, meu amigo, fazia todas as minhas vontades, vivia beijando a minha barriga. Seu maior sonho era ver o rosto do filho."

Para Antonio Carlos, o Estado errou seguidas vezes no caso. "O tratamento que o Exército deu ao caso é lastimável", afirmou. "O Exército errou ao atirar em alguém que tentava ajudar uma família, errou ao ver a vítima em agonia no chão e não prestar socorro, e errou ainda ao ignorar o sofrimento da família", resumiu.

Atendimento

Naquele mesmo domingo, Luciano foi afinal levado para o Hospital Estadual Carlos Chagas, onde morreu na manhã desta quinta-feira, depois de ter sido submetido a uma cirurgia que, segundo o advogado João Tancredo, que está atendendo à família, não foi autorizada pelos parentes e acabou contribuindo para a sua morte.

Havia ainda uma determinação judicial para transferir Luciano a um hospital com maiores condições de atendimento que não foi cumprida. "Os médicos fizeram uma cirurgia que não foi autorizada, quando já havia essa determinação de transferência que não foi cumprida pelo hospital", contou o advogado. "Isso não é só descaso, é assassinato. É lamentável que se trate pessoas assim porque são mais pobres, mais modestas. Não sei qual é a intenção dessas pessoas de fazer tanta maldade."

O advogado afirmou que pretende entrar na Justiça pedindo a execução imediata das multas fixadas pelo não cumprimento da determinação judicial. Além disso, vai representar contra o hospital que não acatou a decisão e contra os médicos que fizeram a cirurgia não autorizada. Posteriormente, Tancredo pretende pedir uma indenização para a família de Luciano e reparação por danos morais.

Em nota, a Secretaria de Estado de Saúde informou que "o paciente apresentava estado de saúde gravíssimo desde a entrada na unidade, o que impossibilitava sua transferência". A nota sustenta ainda que "a secretaria reitera a confiança nos profissionais da unidade durante o caso e acredita que o atendimento precoce prestado ao paciente foi fator decisivo na busca para salvar a vida de Luciano, apesar da gravidade da lesão".

Antônio Carlos Costa e João Tancredo contaram também que em nenhum momento o Exército ofereceu ajuda para o tratamento de Luciano Macedo e ainda que militares teriam estado no hospital na última quarta-feira supostamente para colher um depoimento da vítima. Tanto a mulher de Luciano quanto a mãe dele, Aparecida Macedo, de 59 anos, teriam ficado assustadas com a presença dos militares.

"É uma vergonha que ninguém tenha procurado a família para oferecer o melhor atendimento hospitalar", assinala Costa. "Soldados do Exército entraram ontem no hospital sem expressarem nenhum interesse pela vida de Luciano e de sua família; estão todos muito decepcionados, machucados, sem saber o que fazer; a esposa e a mãe estão na casa de amigos, sem lugar para morar."

Segundo informações do Comando Militar do Leste (CML), a informação de que militares teriam ido ao hospital para colher um depoimento de Luciano não procede. "Conforme ofício encaminhado ao referido Hospital, foi solicitada apenas, por orientação do Ministério Público Militar, cópia do Boletim de Atendimento Médico do Sr. Luciano. Esse documento é necessário para consubstanciar as diligências ora em andamento, solicitadas pela Justiça Militar da União", informou o CML.

A instituição informou ainda que um militar do CML já estaria em contato com representantes das famílias de Evaldo Rosa e Luciano Macedo para dar início a tratativas sobre eventual apoio material.

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